quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Direitos econômicos, o grande produto do futebol

Roberto Pugliese Jr - Advogado

O “passe” já era! Ainda que muitos insistam em mantê-lo vivo, o “passe” foi extinto por força do artigo 93 da Lei Pelé – Lei Federal n. 9.615/98. O “passe” era a importância devida de um clube para outro, para a cessão do jogador de futebol, ainda que após o término de seu contrato (art. 11 da Lei 6.354/76, conhecida por Lei do Passe).

Pelo dispositivo em questão, que passou a vigorar apenas em 26 de março de 2001, por força do artigo 28, §2º da Lei Pelé, o vínculo desportivo dos atletas de futebol passou a ser acessório ao vínculo empregatício, ou seja, se dissolvendo definitivamente após o término do prazo do contrato de trabalho ou mediante pagamento de cláusula indenizatória obrigatória. Portanto, aquele direito denominado “passe”, que mantinham os clubes como verdadeiros “donos” de seus atletas já não mais existe. A partir de 2001 os jogadores não pertencem mais aos clubes, mas somente podem manter contratos de trabalho por prazo determinado com estes, permanecendo vinculados enquanto vigorar o respectivo contrato. Por força desta transformação que ocorreu no mundo inteiro e representou tamanha evolução jus desportiva, os clubes brasileiros perderam alguns anos reclamando das novas normas antes de adaptarem-se à nova realidade jurídica e econômica do futebol mundial.

Agora vigora uma nova era, a era dos direitos federativos e econômicos. Direitos federativos são aqueles adquiridos pelo clube empregador, que passa a deter o vínculo desportivo do atleta após o registro do contrato de trabalho na confederação. Os direitos econômicos nascem deste vínculo, consistindo na receita econômica futura e eventual, decorrente da cessão provisória (empréstimo) ou definitiva dos direitos federativos, em razão da existência de contrato de trabalho e cláusula indenizatória.

Estes direitos econômicos são atualmente o grande produto do futebol. Foi-se o tempo em que os clubes subsistiam com suas arrecadações de bilheterias. Nem mesmo os maiores esquadrões do futebol mundial, tais como Real Madrid, Milan, Manchester United, Chelsea, sobrevivem somente das apresentações e conquistas de seus planteis nas grandes ligas que disputam, eles dependem de direitos de transmissão televisivos, patrocínios vultuosos, incansável exercício de marketing, dentre muitas outras decorrentes da exploração da imagem de seus jogadores

No Brasil a situação é mesma: o três vezes campeão mundial e atual tricampeão brasileiro, conhecido por sua competência administrativa e estrutura diferenciada, São Paulo F. C., divide com o River Plate da Argentina, o título de maior exportador de atletas do mundo, e conseqüentemente, detentores do record de arrecadação em transferências. O exemplo tricolor se encaixa perfeitamente em outros inúmeros grandes clubes brasileiros igualmente exitosos em suas administrações, tais como Cruzeiro, Internacional, Grêmio, Atlético Paranaense, Santos, Palmeiras etc., que hoje sobrevivem com sucesso graças à rotineira negociação de direitos federativos e econômicos de seus jogadores, sustentando igualmente com sucesso suas categorias de base, formando novos e talentosos atletas que em seguida também serão objeto de transferência ao milionário futebol europeu ou centros alternativos como o árabe, asiático e até mesmo norte americano.

Corroborando com essa grande lucratividade decorrente da negociação de direitos de atletas, estão os grupos investidores e empresários de atletas, que se antecipam aos mercados importadores adquirindo percentuais dos direitos econômicos dos jogadores, sabendo que dentro de pouco tempo poderão renegociá-los com outras inúmeras agremiações espalhadas pelo mundo, aferindo lucro considerável. Tais negociações costumam ocorrer com atletas jovens, cujo mercado mundial é promissor, de modo que os investidores passam a formar uma espécie de sociedade com o clube formador, dividindo riscos e benefícios resultantes das carreiras dos mesmos. Para os nossos clubes, integrantes de todas as séries, divisões, independentemente de sua região geográfica, esta se apresenta como uma boa alternativa, já que dependem de novos recursos para subsistirem com gestão profissional e eficiente, e principalmente para que consigam fechar suas contas ao final do ano com o menor déficit possível.

O Regulamento sobre Estatuto e Transferência de Jogadores da FIFA veda tal prática, ao asseverar que “o direito a indenização por ruptura contratual é exclusivo da parte que sofrer a ruptura e não pode ser cedida a nenhum terceiro”, sob pena de imposição de medidas disciplinares por seu Comitê Disciplinar. Com essa medida a FIFA visa afastar a influência de terceiros (empresários e investidores) nas relações contratuais entre clube e atletas, protegendo a relação laboral. De outra parte, apesar da cessão onerosa de percentuais de direitos econômicos não encontrar fundamento expresso na legislação desportiva pátria, esta é perfeitamente legal, fundada em normas de ordem civil.

Ainda que contrária aos ditames da Entidade Suprema do futebol mundial, mesmo com a deficiência da legislação brasileira na proteção do clube formador, o mercado é cristalino ao demonstrar que investir na formação de jovens atletas é o melhor negócio para o sucesso econômico das entidades esportivas, potencializando o surgimento de novos craques detentores de valorosos direitos econômicos, o maior produto do futebol na atualidade.

Roberto J. Pugliese Jr.

Advogado, sócio da Pugliese e Gomes Advocacia e da Agôn Assessoria Esportiva; militante na área do Direito Desportivo; especialista em Gestão e Marketing no Esporte; Auditor do Tribunal de Justiça Desportiva do Sistema Catarinense de Desporto; membro do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo e da Comissão de Estudos do Direito Desportivo da OAB/SC.

Fonte: Pugliese e Gomes Advocacia

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