sábado, 6 de junho de 2009

Jornal Biguaçu em Foco, 05-06-2009

Meio ambiente, propriedade ou bom senso?
por Emerson Souza Gomes
O direito de propriedade é qualificado como um desdobramento do direito de liberdade. Em rápida síntese, o proprietário tem o direito de exercer livremente os poderes inerentes à propriedade, ou seja, usar, dispor, fruir e reivindicar a propriedade de quem quer que a tenha injustamente. Por este motivo o direito de propriedade é uma expressão da liberdade. Não se trata, porém, de um direito absoluto. A propriedade deve atender a uma função social, sendo que o exercício de quaisquer de seus poderes não pode vir a prejudicar a sociedade. De outra parte o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito e preservá-lo, um dever de todos. Se o direito de propriedade é afinado com a liberdade, o meio ambiente tem amparo num dever de fraternidade. Não numa fraternidade vista sob o enfoque religioso-dogmático, mas numa fraternidade social. Todos compartilham um mesmo espaço e este espaço todos devem preservar, pois que em sede de meio ambiente, todos estão muito próximos.Na teoria a convivência destes dois direitos (propriedade e meio ambiente) é relativamente pacífica. Na prática, no entanto, é de dificílima compatibilização, sobretudo pelo fato de que a preocupação com o meio ambiente tem sido potencializada nas últimas décadas e com razão. As alterações climáticas, a possível extinção de espécies animais e vegetais, a destruição da camada de ozônio, dentre outras, fez e faz com que os poderes públicos tomem atitudes drásticas. Entretanto, não existe (repito) direito absoluto. O direito de propriedade nem sempre deve ceder, apesar de que tal afirmação possa aparentar para ambientalistas uma excrescência. Mais importante do que propriedade e o meio ambiente é o ser humano e, principalmente, a sua dignidade. Assim, medidas imediatistas ou revolucionárias para solução de problemas ambientais, são quase sempre traumáticas, revelam uma atitude arbitrária do estado para com o cidadão e principalmente tiram o foco político dos grandes algozes do meio ambiente: a atividade industrial, a cultura do consumismo e a falta de educação ambiental.
Por fim, vale lembrar que a solução de uma lide que tenha de um lado a propriedade e de outro o meio ambiente, mais requer a razão e a proporcionalidade do que a lei escrita no papel. O conflito aparente entre os direitos de propriedade e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, não tem - via de regra - um solução escrita na lei ou em resoluções: É algo que tem a sua solução, por estranho que soe, no bom senso, na sensatez... Assim, entre meio ambiente e propriedade, a opção deve ser única: O bom senso!

DireitoNet, 20-02-2004


Elementos da equiparação salarial

Uma visão geral sobre o instituto da equiparação salarial, seus elementos, abordagem doutrinária e comportamento jurisprudencial.

por Emerson Souza Gomes


1. FUNDAMENTO:

Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário. Esta é a expressão do artigo 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, que tem como fundamento o inciso XXX do artigo 7° da Constituição Federal, o qual proíbe a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão, por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

Verificado, então, os pressupostos para a isonomia, ou seja, a identidade de função com a mesma produtividade e qualidade; a identidade de empregador e de local de trabalho; e, por fim, a de tempo de serviço; em não havendo fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do empregado, força se impor a equiparação salarial.


2. SUJEITOS DA EQUIPARAÇÃO E O TEMPO DE SERVIÇO:

São sujeitos da equiparação o “equiparando” e o “paradigma”. Denomina-se “equiparando” o empregado que postula pela equiparação salarial e “espelho” ou “paradigma” o empregado o qual se requer a comparação da função desempenhada e do salário percebido.

Por carecer do exame comparado de funções e salários, demonstra-se juridicamente impossível o exame da pretensão de equiparação salarial a não indicação de paradigma.

Conforme preceitua o § 4° do artigo 461, é fato impeditivo à equiparação, o paradigma ser empregado readaptado em nova função em virtude de deficiência física ou mental, comprovadamente atestada pela autoridade competente da Previdência Social, o que, de passagem, infere-se ser defeso a redução do seu salário.

Ainda como hipótese que exclui o direito à equiparação, há a do paradigma originário de empresa concessionária de serviços públicos encampada por empresa pública ou sociedade de economia mista, nos contornos do Decreto-Lei 855/69.

Não há necessidade que, contemporânea à pretensão de equiparação, equiparando e paradigma, estejam a serviço da empresa, desde que o pedido se relacione com situação pretérita, sendo, no entanto, necessário que em algum momento da relação de emprego tenham ambos obrado juntos para que seja possível a comparação do labor prestado.


3. TRABALHO DE IGUAL VALOR:

O trabalho de igual valor deve ser entendido como aquele que for realizado com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica entre empregados cuja diferença de tempo de serviço não seja superior a dois anos, sendo pacífica a inteligência que o referido interregno deve ser contado considerando o efetivo exercício da função, e não o tempo na relação de emprego, sendo, desta forma, no todo possível um empregado pleitear eventual diferença salarial em decorrência de equiparação com outro trabalhador que, apesar de possuir mais de dois anos de empresa, não tenha tempo superior a dois anos na mesma função.

Releva saber ser possível a diferença de remuneração entre empregados que exerçam a mesma função, mesmo que o tempo de prestação de serviço seja inferior a dois anos, vez que não é defeso ao empregador, através de regulamento interno, adicionar à remuneração do empregado valor que tenha por finalidade gratificar, premiar ou por qualquer outro motivo que não esteja diretamente ligado ao valor do trabalho, diferenciar a situação pessoal de empregado, tendo-se aqui, como exemplo, o adicional por tempo de serviço.

É importante para a equiparação a produtividade e não a produção do empregado. O termo “produtividade” deve ser entendido como capacidade de trabalho, diferente de “produção”, que revela o resultado final do processo. A produtividade deve ser apreciada levando-se em conta fatores materiais ao qual o empregado está submetido, posto que dois trabalhadores, exercendo as mesmas tarefas, em razão de um obrar com equipamento mais novo, mesmo que empregando a mesma técnica, poderá ter uma produção maior da de outro que tiver disponível equipamento já desgastado pelo uso.

Portanto, a questão da igual produtividade é presumida em função do exercício das mesmas tarefas e não da produção final. Provado, no entanto, a diferença de produção, caberá ao empregado aduzir fatos que justifiquem a alegada diferença, como o anteriormente arrolado.

A identidade qualitativa deriva do processo, sendo este a consecução de tarefas almejando determinado resultado: a construção de um produto ou a prestação de um serviço.

Fato é que mesmo em se disponibilizando o mesmo processo a dois empregados, um deles poderá, em função da sua maior experiência, treinamento, ou grau intelectual, aprimorar técnica da qual decorra a diferença da qualidade.

Um bom exemplo para se fixar o sentido do termo “técnica” é o das duas confeiteiras, onde apesar de utilizarem-se da mesma receita – processo - para o cozimento do bolo, uma delas mexe a massa de forma que fique a mesma mais consistente – técnica.

Considerando que a lei prescreve ser passível de equiparação empregados cuja diferença de tempo de serviço não seja superior a dois anos, fatores citados, como, treinamento e experiência, não podem obstar o direito do empregado, mesmo que dispostos em regulamento da empresa, sob pena de ferir preceito de ordem pública, como são os que prevêem a isonomia salarial, como também, eventual diferença de qualidade deve ser apreciada com o devido desvelo, tendo em conta que quanto maior a possibilidade de caracteres pessoais influírem no processo, maior a possibilidade de ser verificada diferença qualitativa no seu resultado.

Outrossim, importa saber que o labor, por ser uma forma de expressão da personalidade, muitas vezes se demonstrará impossível de ser absolutamente idêntico, devendo os pressupostos de igualdade de produção e de perfeição técnica serem auferidos dentro de um grau de razoabilidade, afastando-se a necessidade de excelência do serviço prestado e tendo em foco, dentre outros aspectos, o proveito comparado a que a empresa auferiu com o desempenho da função pelo equiparando e pelo paradigma.

É comum a doutrina asseverar não ser passível de equiparação os trabalhadores que prestem serviços de natureza intelectual, por ser o valor deste trabalho aferido exclusivamente por critérios subjetivos, no entanto, em jurisprudência, encontra-se decisões que admitem tal possibilidade.

Trabalho intelectual. Equiparação salarial. Possibilidade (art. 461 da CLT) Diante da divergência no seio da SDI-I, competente para o julgamento dos embargos em recurso de revista, quanto à possibilidade de aferição dos pressupostos necessários à equiparação salarial do art. 461 da CLT, em caso de trabalho intelectual, foi o feito submetido a exame pela SDI-plena. Entendeu a SDI-plena que é possível a equiparação salarial em trabalho intelectual, desde que observados os requisitos do art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, conforme certidão de fls. 560, ressalvado o entendimento deste redator (Min. Milton de Moura França), cujo voto vencido integra o presente acórdão. Embargos providos no particular, para restabelecer a decisão regional. TST, SEDI-1, AG-E-RR – 197.754/95.1, in DJU de 28.11.97, p. 62365.

É indiferente para o reconhecimento do direito a diferenças salariais o nome do cargo exercido pelo paradigma, sendo relevante tão-somente as tarefas desempenhadas por este, pois tais é que revelam a similitude do trabalho prestado pelo empregado, denotando a sua funcionalidade dentro da empresa.


Há que se acurar, porém, da possibilidade de determinado cargo poder, dentre outras, englobar tarefas análogas à função do equiparando, não se configurando assim a identidade de função e sim, a de tarefas.

Não se deve exigir, ao mesmo tempo, a identidade completa das tarefas, sendo de bom alvitre acolher-se como técnica, comparar a finalidade da função, verificando qual o produto ou serviço obtido ao final do processo, posto que estes revelam as responsabilidades do empregado.

Em sendo idênticos os resultados e em não sendo desproporcionais as tarefas executas para o alcance deste, se infere a prestação do mesmo labor devendo ser entendida como discriminatória eventual diferença de salários.


4. O EMPREGADOR E O LOCAL DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO:

Como mesmo empregador entende-se aquele que assume os riscos da atividade econômica, admitindo, assalariando e dirigindo a prestação pessoal dos serviços, tal qual prelecionado no artigo 2º da CLT, para o qual equiparando e paradigma prestam serviços hodiernamente sob dependência e subordinação.

Entende parcela da doutrina que trabalhando o empregado em empresa que integra grupo econômico não ocorre razão para a isonomia salarial, vez que cada empresa possui características próprias, como rentabilidade, mercado e outras peculiaridades que acabam por repercutir na folha de salários.

À luz do §2° do art. 2º da CLT, quando uma ou mais empresas com personalidade jurídica constituírem grupo econômico, para os efeitos da relação de emprego, todas são solidárias quanto a quaisquer responsabilidades trabalhistas, protegendo-se o obreiro contra o maior poder econômico do empregador, não devendo, desta forma, ser empecilho à equiparação o fato de equiparando e paradigma integrarem quadros diversos, vez que, para o direito, a diversidade de empresas é considerada como um único organismo econômico.

Consoante a jurisprudência dominante, a expressão “mesma localidade” deve ser tida como “mesmo município”, porém, tal inteligência dá azo a injustiças, carecendo ser utilizada com parcimônia, sendo mais razoável verificar, no caso concreto, a realidade geo-econômica a qual paradigma e equiparando vivenciam. Havendo identidade entre estas, nada obsta, por residirem em municípios distintos, que o reclamante tenha reconhecido o seu direito ao mesmo salário, vez que o interessante é apreciar o custo de vida e não a identidade geográfica.

Portanto, há que ser rebatido tal entendimento jurisprudencial, posto o município tratar-se de divisão constitucional político-administrativa, divergindo do conceito do termo “localidade” que revela um espaço circunscrito, podendo tal ser ora o local de uma comunidade, de um bairro, de um distrito, ou, até mesmo, de um aglomerado populacional que abranja dois municípios, como nas regiões metropolitanas, sendo esta circunstância matéria a ser meditada quando da subsunção dos fatos.

A Orientação Jurisprudencial 252 da SDI-I do TST considera que o conceito de “mesma localidade” refere-se em princípio ao “mesmo município”, ou a municípios distintos que, comprovadamente, pertençam à mesma região metropolitana.


5. SUBSTITUIÇÃO E SUCESSÃO:

Quanto ao empregado que substitui outro que aufere maior salário, sendo sua duração certa, tome-se como exemplo o período de férias, e afastada a eventualidade da substituição, isto é, não sendo fruto do acaso, o empregado substituto tem direito à contraprestação econômica idêntica a do empregado substituído, encontrando amparo a pretensão no tutelado no artigo 5º da CLT, que assevera que a todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual.

Interessante para a equiparação salarial, verificar o preceituado no artigo 450 da Consolidação que delineia as condições para a substituição de cargos em comissão, denotando que exercida interinamente ou em regime eventual ou temporário, é garantida somente a contagem do tempo naquele serviço, como também, retorno ao cargo anterior, passando ao largo o dispositivo quanto à remuneração do empregado substituto.

O Tribunal Superior do Trabalho, em seu enunciado 159, veio suprir a lacuna, tutelando que “enquanto perdurar a substituição que não tenha caráter meramente eventual, o empregado substituto fará jus ao salário contratual do substituído”.

Vale, no entanto, nota quanto à hipótese de empregado que é chamado a ocupar cargo definitivamente, não havendo, por óbvio, substituição e sim, sucessão. Neste caso, em jurisprudência, não há direito a qualquer equiparação salarial, sendo permitido ao empregador pagar salário menor ao que era pago ao empregado sucedido.

“Salário substituição: Quando um empregado fica no lugar do outro, definitivamente, tecnicamente falando, não há substituição e sim a sucessão. E, nesta hipótese, não há lei que garanta o direito de o sucessor receber o mesmo salário do sucedido. TST, 1ª T., RR-107-938/94, in DJU 25/11/94, p. 32428.”

Não poderia ser outra a inteligência, eis que por falta de paradigma, revela-se impossível o reconhecimento da equiparação salarial, porém, é de escancaro que o salário do sucessor deverá ser acrescido de um plus remuneratório, sob pena de se configurar a novação salarial, podendo o empregado decidir pela rescisão indireta em virtude da alteração unilateral do contrato de trabalho.

Ainda, no tocante a substituição, o artigo 473 da CLT enumera hipóteses em que tal substituição assume o caráter eventual, obstando desta maneira a equiparação de salários, tais como, a falta ao serviço até três dias consecutivos, em virtude casamento (473, II) ou em até dois dias consecutivos ou não, para o fim de se alistar eleitor (473, VI), dentre outras.


6. QUADRO DE CARREIRA:

O §2º do artigo 461 traz como fato impeditivo ao direito do empregado haver diferenças salariais, quando o empregador tiver pessoal organizado em quando de carreira, sendo que as promoções deverão obedecer aos critérios da antiguidade e merecimento.

Salienta-se que tal fato não retira a competência da Justiça Especializada de apreciar reclamação de empregado que tenha por objeto direito fundado em quadro de carreia, consoante enunciado 19 do TST.

É orientação jurisprudencial do TST que o simples desvio funcional do empregado não gera direito a novo enquadramento, mas apenas às diferenças salariais respectivas.

Ainda, conforme a doutrina e o próprio Tribunal Superior do Trabalho, o empregador que arregimentar empregados sob quadro de carreira, deverá proceder a devida homologação do quadro junto ao Ministério do Trabalho, sob pena de invalidade do mesmo, inteligência expendida do Enunciado 6 do Egrégio e que exclui de tal exigência as entidades de direito público, autárquicas, e fundacionais que têm a aprovação por ato administrativo da autoridade competente.

Por último, os critérios de merecimento e de antiguidade deverão ser aplicados alternadamente sob pena de invalidade. Quanto ao mérito da promoção, não é passível de apreciação pelo Judiciário, pertencendo a sua avaliação de pleno direito à empresa.


7. PROVA DO EXERCÍCIO DA MESMA FUNÇÃO:

Cabe ao empregador aduzir fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito à equiparação salarial, não devendo, porém, tal disposição ser entendida como inversão do ônus probatório, posto que é aplicável somente ao passo que o empregado provar o fato constitutivo do seu direito, isto é, o do exercício da mesma função nos moldes do artigo 461.

Outrossim, alegado pelo empregador o exercício eventual da função a que se requer equiparação, por si só, tem o condão a assertiva de fazer com que o empregador prove tal circunstância. Não o provando, devido é o empregado haver os desníveis salários verificados.

Fonte: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1477/Elementos-da-equiparacao-salarial

Universidade Federal de Santa Catarina, 10-03-2005

Aplicação do princípio da boa-fé objetiva aos contratos de seguro de vida


Emerson Souza Gomes, Advogado.





1. Introdução:



A despeito da presença no ordenamento jurídico da boa-fé objetiva como princípio norteador dos contratos e da caudolosa jurisprudência expendida pelos Tribunais afirmando que a má-fé do segurado, quanto as suas declarações, deve ser robustamente provada, têm, por vezes, empresas seguradoras e subsidiárias de instituições financeiras que operam no ramo securitário, alegado impropriamente o motivo da doença pré-existente como óbice à liquidação da importância segurada no caso do evento morte natural do segurado.



Com fundamento na legislação pertinente, na doutrina e no comportamento jurisprudencial, o presente artigo compila inteligência favorável ao pagamento da indenização avençada, considerando que, nos contratos de seguro onde há por parte da seguradora a dispensa de exame médico prévio, é indiferente para a liquidação da obrigação o estado de saúde do segurado quando da celebração do contrato e sim, a qualidade da sua declaração, ou seja, se de boa ou má-fé.





2. Sobre a boa-fé nos contratos de seguro:



Com o advento da novel legislação civil, iluminada pelo princípio da “eticidade”, a boa-fé passou a ser guia de conduta dos contratantes, obrigando uma conduta arrimada na retidão de proceder, dessumindo-se desta deveres de lealdade e solidarismo, dentre outras virtudes. Aliás, após o Código, a boa-fé passou a ser analisada objetivamente, ou seja, não com base nas qualidades dos contratantes, mas num agir ordinário, no que efetivamente a sociedade espera da conduta do homem médio nos seus negócios habituais.



Consoante a redação do art. 442 “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé.”. O laureado Silvio de Salvo Venosa, enfatiza o princípio da boa-fé como dever das partes contratantes: “Coloquialmente, podemos afirmar que esse princípio se estampa pelo dever das partes de agir de forma correta antes, durante e depois do contrato. Isso porque, mesmo após o cumprimento de um contrato, podem sobrar-lhes efeitos residuais.” [1] Especificamente, no que concerne aos Contratos de Seguro, o artigo 765 do Código traça como azimute à conduta dos contratantes a boa-fé: “O segurado e o segurador são obrigados a guardar no contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, assim a respeito do objeto, como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.”



Conforme Cláudia Lima Marques “os contratos de seguro foram responsáveis por uma grande evolução jurisprudencial no sentido de conscientizar-se da necessidade de um direito dos contratos mais social, mais comprometido com a equidade, boa-fé (...).



(...) há de se presumir a boa-fé subjetiva dos consumidores e se impor deveres de boa-fé objetiva (informação, cooperação e cuidado) para os fornecedores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão.” [2]



Linha esta presente no Código de Proteção e Defesa do Consumidor que literalmente, alça a boa-fé como princípio norteador da política nacional de relações de consumo, precisamente no seu art 4º, III. Em comento ao dispositivo, ainda na letra de Cláudia Lima Marques: “Poderíamos afirmar genericamente que a boa-fé é o princípio máximo orientador do CDC;” [3]



Denote-se que a doutrina colabora para que, primordialmente, presuma-se a boa-fé do consumidor. Vejamos ainda: “As linhas de interpretação asseguradas pela jurisprudência brasileira aos consumidores em matéria de seguros são um bom exemplo da implementação de uma tutela especial para aquele contratante em posição mais vulnerável na relação contratual, antes e depois da entrada em vigor do CDC. Aqui há de se presumir a boa-fé subjetiva dos consumidores e se impor deveres de boa-fé objetiva (informação, cooperação e cuidado) para os fornecedores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão.” [4]



Bem assim, oportuna a letra do tratadista Arnaldo Rizzardo, que em sua obra “Contratos”, acentua: “Mas não basta a mera constatação de um fato não revelado para desvincular do encargo de indenizar. A má-fé deverá ficar provada, ônus que incumbe ao segurador. Interpreta-se em favor do segurado a avença em casos de dúvidas e omissões. E se o segurado, ao fazer as declarações, não obrou de má-fé, subsiste a obrigação da indenização”.



Ademais, justifica o tratadista: “É que a seguradora se apóia nas perspectivas favoráveis que resultam das previsões atuariais. Sabe, de antemão que, entre os segurados, dispensada a cautela do exame médico, poderá haver alguns doentes e até gravemente enfermos. O risco, todavia, é coberto com largueza pela vantagem proveniente do grande número de segurados que aderem ao sistema de seguro, e não padecem o infortúnio. Constituem dados de presunção de que a seguradora, voluntariamente, dispensa o exame e aceita o risco: a idade do segurado, a profissão, o regime e a espécie de trabalho exercida, e a compleição física e mental. [5]”



Assim, em sintonia legislação e doutrina asseveram a boa-fé contratual como princípio norteador, tanto das relações consumeirista, como das demais relações privadas, evidenciando o dever da seguradora de comprovar a má-fé do segurado quando da contratação do seguro.



Sobretudo, inteligência conectada à presunção de inocência, disposta no art.5º da Constituição Federal.





3. Sobre o comportamento jurisprudencial:



Não diferente tem sido o entendimento dos Tribunais. Em arestos colacionados adiante, no espírito e letra da novel legislação privada e do Código do Consumidor, verifica-se que a seguradora somente se vê desobrigada a adimplir ao pacto no caso de comprovada a má-fé do contratante.



“12154 - SEGURO DE VIDA - Prescrição. Doença preexistente. Má-fé. Ônus da prova. Art. 585, III, do CPC. O contrato de seguro é título executivo extrajudicial, consoante o art. 585, III, do CPC. O art. 178, § 6º, II, do CC regula o prazo prescricional apenas da ação do segurado e vice-versa, não sendo lícito aplicar-se o mesmo preceito aos beneficiários do seguro. É vedado à seguradora recusar-se ao pagamento do valor da apólice de seguro de vida sob alegação de doença preexistente, se não comprovar a má-fé do contratante, consubstanciada em declarações inverídicas quanto a seu estado de saúde, hipótese em que inaplicável o art. 1.444 do CC.” (TAMG - AC 226.398-9 - 7ª C - Rel. Juiz Lauro Bracarense - DJMG 24.05.97)



“Se não demonstrado convincentemente ter o segurado agido de má-fé ou que a omissão, ao prestar informações, foi intencional, o contrato é válido, devendo a seguradora efetuar o pagamento do benefício. Dispensando a seguradora, no contrato, exame médico, há que se crer na palavra do segurado, cabendo àquelas provar a má-fé deste. Em caso de dúvida, resolve-se em favor do segurado” (JC 72/395)” (AC n. 97.015052-0, de Blumenau, relator: Desembargador Anselmo Cerello).



O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacifica a questão, configurando como omissa a conduta da seguradora que não exige exame para admissão de segurado.



“Seguro-saúde – Doença preexistente – AIDS. Omissa a seguradora tocante à sua obrigação de efetuar exame de admissão do segurado, cabe-lhe responder pela integralidade das despesas médico-hospitalares havidas com a internação do paciente, sendo inoperante a cláusula restritiva inserta no contrato de seguro-saúde. Recurso conhecido em parte e parcialmente provido.” (STJ, Resp 234219/SP, 4ª Turma, Rel. Min.Ruy Rosado de Aguiar, j.15/05/2001) e Resp 300215/MG, 4ª Turma, Rel. Min.Aldir Passarinho Junior, j.29.05.2001, fonte: Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 394)



Destarte, no tocante à conduta da seguradora em após ter firmado o pacto, obstaculizar-se ao pagamento da importância segurada deduzindo doença preexistente ou defeito na declaração do segurado, cabe ainda a nota da doutrina que assevera: “o direito contratual passa a realizar um controle da liberdade contratual, controle da liberdade do mais forte, proteção da liberdade do outro, do contratante mais fraco; controle sempre baseado nos princípios maiores da boa-fé objetiva e da necessária proteção da confiança na sociedade de consumo [6].”



Nesta proteção, em a seguradora se subtraindo ao pagamento da indenização, mesmo tendo aceitado os riscos da omissão, não exigindo exames prévios de saúde, denota-se agressão à confiança mediana, conquanto ao fornecedor não é facultado propiciar surpresas ao consumidor.



Cumpre assim concluir que, mesmo que preexistente, porém desconhecido o mal que adveio ao segurado, não tem a seguradora o direito de escusar-se ao cumprimento da prestação, posto que relevante à lei não é o estado material do segurado ao tempo do contrato e sim, a qualidade da sua declaração, ou seja, se de boa ou má-fé. Anote-se: "Havendo boa-fé quando da contratação do seguro, ainda que a enfermidade seja preexistente, a cobertura do risco pela seguradora é conseqüência do contrato" [7]



Bem assim, eventuais diligências do segurado para o cuidado da saúde, não autorizam igualmente o não pagamento da importância segurada, muito menos ainda, podem configurar a má-fé do segurado quando da contratação do seguro.



A jurisprudência acompanha a inteligência:



“Seguro de vida em grupo – Falecimento do segurado – Se o segurado foi submetido a tratamento especializado, um dia após a contratação do seguro, tal fato por si só, não significa que o mesmo tenha agido com má-fé, ao subscrever a proposta de renovação do seguro de vida em grupo, como vinha fazendo durante longos anos. A data em que ocorreria o evento morte era incerta; além do mais, a doença se instalara no organismo do segurado em data bem anterior, na vigência de algum dos contratos de seguro que celebrou. E a má-fé não pode ser presumida, mesmo em se tratando de um contrato de seguro. Portanto, deve a seguradora arcar com o pagamento da indenização correspondente ao seguro, pois durante longos anos recebeu o prêmio e assumiu o risco pelo pagamento.” (1º TACSP – 2ª C. – Ap. Rel. Alberto Tedesco – j.03.08.94 – RT 715/170, fonte: Rui Stoco in Responsabilidade Civil e sua interpretação Jurisprudencial, 3ª edição, revista e ampliada, editora Revista dos Tribunais, pág.258)



“Seguro de vida – Perda do direito – Inadmissibilidade – Morte decorrente de cirurgia cardíaca – Seguradora que alega que o segurado era portador de moléstia grave quando da assinatura da proposta, por ter-se submetido pouco tempo antes a exame de coronária e coração. Cateterismo que constitui exame para diagnóstico e não síndrome – Segurado, ademais que levava vida ativa – Má-fé não caracterizada – Verba devida – (...)” (1º TACSP – 4 C.Esp. – Rel.Roberto Mendes de Freitas – j.31.1.94 – RT 715/170, fonte: Rui Stoco in Responsabilidade Civil e sua interpretação Jurisprudencial, 3ª edição, revista e ampliada, editora Revista dos Tribunais, pág.253)





4. Conclusões:



Do alinhado, havendo contratação de seguro de vida, com dispensa de exame médico prévio, constata-se evidente o direito do beneficiário do seguro em haver da seguradora o valor contratado como importância segurada para o evento morte natural, sendo independente uma apreciação do estado de saúde do segurado no ato da contratação, importando tão somente a qualidade da sua declaração, como já fixado, se de boa ou má-fé.



Consoante a jurisprudência e a doutrina, cabe à seguradora a prova de má-fé do segurado quando da contratação do seguro, sobretudo, em função da presunção constitucional de inocência.



Por último, a má-fé deve restar evidenciada de forma contundente, não importando como prova de má-fé, diligências do segurado para cuidados da sua saúde.







[1] www.societario.com.br



[2] Claudia Lima Marques in Contratos do Código de Defesa do Consumidor, o novo regime das relações contratuais, 4ª edição. Editora Revista dos Tribunais, 2.002, p. 394



[3] Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 671



[4] Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 394 e 395



[5] Arnaldo Rizzardo in Contratos, 2ª edição, editora Forense, 2001, p.546



[6] Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 593



[7] Revista Jurisprudência Mineira, v. 36, p. 227-232.



Fonte: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/view/24428/23991

Jornal A Noticia, 11-04-2005

Feira do Livro de Joinville reuniu autores da região

Marlise Groth

Joinville - O dia de sol contribuiu para que o joinvilense saísse de casa no domingo e prestigiasse a segunda edição da Feira do Livro, realizada na praça Nereu Ramos, bem no centro da cidade. Com a presença de escritores de Blumenau, Jaraguá do Sul, Guaramirim, Itajaí e Joinville, pela manhã, o evento contou com a apresentação de poesias e leitura de textos pelos próprios escritores e um anúncio que deve mexer com o cenário cultural catarinense em 2006: editores de Jaraguá do Sul prometem realizar a primeira semana literária de Santa Catarina, evento semelhante ao que ocorre em Parati, no Rio de Janeiro. "O Estado comporta um evento do gênero e nós temos que fomentar esse tipo de iniciativa para valorizar os autores locais e estimular o acesso ao livro", registra o escritor Carlos Henrique Schroeder.
Para o maranhense J. C. Ramos, escritor radicado em Itajaí, que autografou "Fragmento Essencial" (ed. Momento Atual) e distribuiu preservativos embalados em poesia, eventos como o de Joinville "são de suma importância para a cultura brasileira". Ele marcou presença nas feiras de Itajaí, Balneário Camboriú e Blumenau e promete prestigiar os jaraguaenses em 2006. Escritora e poeta Neida Woberto, de Blumenau, diz que é preciso "diminuir a distância entre o povo e o livro e facilitar o acesso aos escritores". Blumenau compareceu ao evento com sete representantes, inclusive com sua mais jovem revelação: Lorraine Beatrice, uma escritora que lançou sua primeira obra aos 12 anos. No sábado, o jornalista Celso Martins, de Florianópolis, e integrante da equipe de A Notícia, autografou o livro "Anita Garibaldi - A vida de uma heroína", lançado em 2004 pela editora paulista Anita Garibaldi.


preços

Com roupas leves e boné para se proteger do sol, Rosângela Dornelles visitou a feira acompanhada da família. Gostou dos preços, especialmente dos títulos voltados para a educação de adolescentes e literatura infanto-juvenil. "Tenho filho nessa idade e prestei mais atenção nesse tipo de literatura", justifica. O advogado Emerson Souza Gomes aproveitou a manhã para vasculhar um estande de sebo. "Os livros e as ofertas são variadas e, num País onde o público está sempre preso a veículos rápidos de mídia, como o rádio e a televisão, a feira oferece o acesso, um contato mais direto com o livro", afirmou. Do seu ponto de vista, uma maneira de atrair os moradores da periferia para a feira é trazer atrações que façam sucesso nesses bairros. "Grupos populares de música, canto, teatro", ilustrou. O vice-prefeito e presidente da FCJ, Rodrigo Bornholdt também visitou os estandes no domingo à tarde. Entre o dia de abertura, na sexta-feira, e sábado à noite, foram comercializados 5 mil livros.
A feira prossegue até 17 de abril, das 9 às 21horas.

Revista Making Of, 06-05-2009

Escritório de advocacia expande em Santa Catarina

Pugliese e Gomes Advocacia chega este mês a Florianópolis. A banca de advogados que já possui escritórios em Joinville e São Francisco do Sul, leva para os atuais e futuros clientes a experiência de mais de 13 anos em áreas como Direito Imobiliário, Ambiental, Empresarial, Desportivo e Previdenciário ao inaugurar sua mais nova filial na captial catarinense. Os sócios do Escritório, Roberto Pugliese, Roberto Pugliese Júnior, Elaine Gomes e Emerson Souza Gomes, e seus advogados associados, oferecem trabalho especializado, com clientes representados e resultados exitosos em processos levados até as últimas instâncias da Justiça pátria.

A Apoio Comunicação + Marketing, que também já atua no mercado de comunicação há mais de 10 anos passa a atender a conta do escritório com abrangência nacional.

Revista Jus Navigandi, 24-04-2004

ASPECTOS DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO DO CAIXA-BANCÁRIO


por Emerson Souza Gomes*


De natureza jurídica contratual e de caráter salarial, a gratificação do caixa bancário integra base de cálculo para todos os efeitos legais (1), inclusive para o pagamento de jornada extraordinária.

Conforme Eduardo Gabriel Saad, a gratificação de quebra de caixa "destina-se a cobrir eventuais diferenças as quais ocorrem com freqüência com os empregados incumbidos dos recebimentos e dos pagamentos de interesse da empresa" (2).

Não nos filiamos a este entendimento, por achar que força a concluir ser permitido ao empregador transferir os riscos da atividade do empreendimento, como também, por subtrair o caráter salarial da gratificação auferida.

Atribuímos, outrossim, como causa à gratificação, o exercício de função de maior fidúcia, porém que não configura a "especial" inerente aos cargos de confiança bancária, estando o caixa-bancário submetido à jornada especial do artigo 224, fazendo jus as sétima e oitava horas como extras.

Por ser silente a norma especial quanto ao mínimo contraprestativo, o valor da gratificação é de livre estipulação entre as partes, devendo constar no regulamento da empresa ou em pactos coletivos.

É ilegal qualquer desconto salarial a título de diferença de caixa, mesmo que disposto no regulamento da empresa, dado a sua natureza de cláusula geral adesiva ao contrato de trabalho.

Pelo §1º do art. 462 da CLT, o acordo individual no qual o bancário aquiesce com os descontos faz elidir a intangibilidade do salário, porém, temos que tal avença limita-se ao valor da gratificação auferida com a função e não implica em o bancário assumir os riscos da atividade do empregador (3).

Cessado, no entanto, o exercício da função, com a conseqüente supressão da gratificação, indevidos quaisquer descontos, posto que a interpretação do dispositivo é em favor do empregado, considerando-se assim que qualquer autorização se limita a decréscimo econômico no correlato ganho, ou seja, na respectiva gratificação auferida, ressalvando-se o caso de dolo ou culpa grave, que autorizam o empregador a haver prejuízos causados pelo empregado.

Há que se denotar que, consoante o artigo 7º da Constituição Federal, inciso VI, a redução de salários somente é possível através de convenção ou acordo coletivo, não sendo igualmente possível ao empregado renunciar à irredutibilidade.

Destarte, por não configurar fidúcia especial o exercício da função de caixa, a reversão do empregado ao cargo efetivo não autoriza o decréscimo salarial (4).

Entendemos, no entanto, que o enunciado constitucional não tutela o animus do não trabalho, sendo somente aplicado em sua plenitude nos casos em que o empregador suprimir o exercício da função.

É de nota que os estabelecimentos bancários debitam em contas de titularidade do empregado as diferenças negativas verificadas no fechamento diário, que após carência, devem ser creditadas.

Em contrariu sensu, qualquer sobra em caixa é lançada em conta "titular-razão", sendo apropriadas numa periodicidade semestral ou não, em conta de receita o qual comporá o lucro da instituição financeira, o que é de censura, sendo mais próprio que o montante apurado revertesse diretamente à sociedade.

Por fim, com a devida vênia, imiscuímo-nos na conduta administrativa com o fim de pacificar a controvérsia dos descontos, achando ser mais acertado que eventuais diferenças sejam suportadas pela instituição financeira, por culpa in eligendo, sem prejuízo de um plus remuneratório ao bancário que exerça as funções de caixa.


* Advogado, especialista em direito empresarial

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Notas

1 Ver enunciado 247 do TST

2 CLT Comentada, Editora LTr, 35ª edição, 2002, p.290

3 Em sentido contrário TST, RR 529315

4 Ver. arts. 450 e 468, parágrafo único, CLT.


Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
GOMES, Emerson Souza. Aspectos da gratificação de função do caixa-bancário . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 291, 24 abr. 2004. Disponível em: . Acesso em: 06 jun. 2009.

Revista Jus Vigilantibus 04-09-2004

A vulnerabilidade da pessoa jurídica no Código Civil

por Emerson Souza Gomes

Dentre as alterações havidas no ordenamento jurídico, a partir do advento do Código Civil de 2.002, encontramos o instituto da lesão, tutelado no art. 157 e nos seus dois parágrafos.

Conforme a redação do caput, “ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.”

Cumpre fixar que o dispositivo é aplicável não somente às pessoas naturais, mas, da mesma forma, em negócios jurídicos entabulados entre pessoas jurídicas.

É oportuna a nota ao passo que o Código de Proteção e de Defesa do Consumidor (CPDC) tão somente protege a empresa quando esta figure na relação jurídica como destinatário final do produto ou serviço.

Assim sendo, o Diploma Civil reconhece o estado de vulnerabilidade da empresa ao passo que reste configurada a premente necessidade, ou a inexperiência.

Outrossim, é sobranceiro o instituto, posto que o art. 220 do Código Comercial de 1850, cuja parte geral foi expressamente revogada pelo novel Diploma, reputava inaplicável o mesmo nos contratos entre comerciantes, afirmando que “a rescisão pôr lesão não tem lugar nas compras e vendas celebradas entre pessoas todas comerciantes, salvo provando-se erro, fraude ou simulação”.

Não se aparenta, entretanto, tarefa das mais fáceis configurar as condições estabelecidas na lei para que a empresa possa imediatamente à avença, ser reputada vulnerável.

Arriscamos deduzir que um parâmetro a servir de norte para a apreciação da premente necessidade que origina a prestação desproporcional, advenha de um risco enormíssimo para a continuidade das atividades da empresa, colocando em cheque a concretização dos seus objetivos caso não ocorra a tratativa.

Bem assim, a inexperiência é indissociável da profissionalidade dos dirigentes, bem como, dos seus setores administrativos na espécie de negócio firmado. Desta forma, uma análise focada no porte da pessoa jurídica, na sua tradição, no ramo de atividade, sem exclusão do objeto contratual, requer-se imprescindível para a aplicação do instituto.

Especialmente no que condiz ao objeto contratual, diante da constante interação de mercados, da competitividade, da necessidade das empresas buscarem se adequar velozmente aos sucessivos cenários do mundo dos negócios, tais fatores, invariavelmente, impõem a incursão do empresário em tratativas antes desconhecidas, mas que hodiernamente se apresentam como imposições para a eficiência e para o lucro do organismo econômico, tal como negócios envolvendo transferência de tecnologia, licenças de uso, franchising, crédito documentado, o e-commerce, e outros até então irreverentes ao cotidiano empresarial.

Outrossim, vislumbra-se a aplicação do instituto da lesão nos contratos bancários, impondo em princípio um tratamento diferenciado de instituições financeiras, sem exclusão de outros organismos de porte análogo, a empresas de pequeno e médio porte.

Há mais que isso, é imperioso frisar que a aplicação do instituto é indissociável da guia ética imposta pelo princípio da boa-fé objetiva, como também da observância da função social dos contratos, institutos que igualmente vieram a incorporar o ordenamento com o advento da nova legislação privada.

Em especial, no que compete a boa-fé, a despeito da lesão ser configurada exclusivamente sob uma análise das condições subjetivas do lesionado, não importando, em princípio, uma ação ou omissão do seu co-contratante, o princípio encetado, dentre outras condutas dignificantes, repudia o proceder que vise a mera “vantage”, impondo aos contratantes deveres de retidão, colaboração e lealdade, excluindo do mundo direito a possibilidade do negócio iníquo, que a nós não discrepa daquele que inicialmente proporciona lesão a uma das partes.

Por fim, de posse dessas considerações, requer a doutrina especular com mais vagar o instituto, buscando a sua adequada aplicação às pessoas jurídicas, que outrora careciam de tutela específica, mas que agora encontram guarida na novel legislação privada.
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Fonte: cedido pelo autor via online

Revista Jus Vigilantibus, Sabado, 4 de dezembro de 2004

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Manutenção de seguro de vida em grupo

Inclui grifos:

Agravo de Instrumento n. 2008.069882-3, de Blumenau
Relator: Des. Eládio Torret Rocha
A unilateral e desmotivada rescisão, pela seguradora, de contrato de seguro de vida em grupo - em vigor há alguns anos - contraria frontalmente o Código de Defesa do Consumidor quanto ao princípio da boa-fé objetiva dos negócios (art. 4°, inc. III), pois frustra a expectativa dos segurados em manter seus interesses protegidos nos moldes pactuados no início da avença, e, bem assim, porque os coloca, ademais, nessa relação jurídica constumeiramente de longa duração, em evidente posição de desvantagem, prática vedada pela sistemática consumerista vigente.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2008.069882-3, da comarca de Blumenau (2ª Vara Cível), em que é agravante Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S/A, e agravada Eletro Mecânica Ideal Ltda.:
ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas de lei.
RELATÓRIO
Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S/A. interpôs agravo de instrumento contra decisão que, nos autos da ação ordinária de manutenção de contrato de seguro de vida em grupo c/c constituição de obrigação de fazer c/c consignação em pagamento n. 008.08.013886-9, da comarca de Blumenau, que lhe move Eletro Mecânica Ideal Ltda., deferiu o pedido de tutela antecipada determinando a renovação da apólice que a agravante mantém com a agravada, nas mesmas condições originalmente pactuadas, inclusive quanto aos reajustes, com a emissão de novo certificado e carnê de pagamento, sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) (fls. 67/70).
Alegou, em síntese, que: a) não foram preenchidos os requisitos do art. 273, do CPC; b) o valor do prêmio é calculado de acordo com os riscos contratados e, uma vez constatado o aumento deles, restou inevitável o reajuste do valor do prêmio; c) decidiu pela não renovação contratual depois que concluiu que o prêmio, em decorrência do aumento dos riscos, ficaria por demais oneroso para as agravadas, o que provocaria grave desequilíbrio contratual; d) existe cláusula expressa nas condições gerais do seguro que prevê a possibilidade de recusa em renovar o contrato; e, e) a cláusula que estabelece a possibilidade de não-renovação foi devidamente autorizada e regularmente fiscalizada pela Susep - Superintendência de Seguros Privados.
Pugnou, finalmente, pelo provimento do recurso.
O pedido de efeito suspensivo foi negado (fls. 95/96).
Regularmente intimada, a agravada deixou de apresentar contra-razões (fl. 101).
É o sucinto relatório.
VOTO
Admito o recurso da seguradora, porém penso que razão se lhe não assiste.
A questão central do presente agravo cinge-se à legalidade - ou não - da postura adotada pela seguradora, ora recorrente, de, unilateralmente, resolver não renovar os contratos de seguro ao término do período de sua vigência, em virtude, segundo alega, do aumento dos riscos inicialmente contratados, o que, conseqüentemente, provocaria elevação no valor do prêmio, tornando o contrato oneroso demais para a agravada.

Enfatizo, de início, que o Código de Defesa do Consumidor é plenamente aplicável aos contratos de seguro, não como legislação complementar, mas sim como norma geral regulamentadora. E isso porque, neste tipo de contrato, estão presentes os três elementos da relação jurídica negocial disciplinada pelo referido diploma, a saber: o consumidor (art. 2°); o fornecedor (art. 3°, caput); e o objeto da prestação, que consiste na garantia da pessoa ou da coisa contra riscos predeterminados, mediante pagamento de prêmio.
Estabelecida esta premissa, fácil concluir, pois, que o princípio da boa-fé objetiva, disciplinado pelo art. 4o, III, do CDC, igualmente deverá ser observado como paradigma para toda relação de consumo, com o objetivo de regular a conduta dos contratantes, inibindo-lhes práticas abusivas.

Oportuno destacar, ainda, que o Código Civil adotou o princípio da boa-fé objetiva nos contratos de seguro, disciplinando em seu art. 765 que "O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes".
Além disso, como é consabido, a legislação consumerista traz no seu artigo 51 o rol de cláusulas contratuais abusivas, as quais colocam o consumidor em total desequilíbrio na relação de consumo, elencando e declarando nula de pleno direito aquela que autorize o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente.
Feitas estas importantes considerações que servirão de base para o deslinde da questão, passo, pois, à análise, no caso concreto, da presença dos requisitos autorizadores da concessão da tutela antecipada.
Ora, o artigo 273 do CPC impõe que a antecipação de tutela somente é viável caso estejam demonstrados, em síntese, a verossimilhança das alegações (amparada por prova inequívoca) e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
As partes, no caso, firmaram contrato de seguro de vida em abril de 2005 - conforme consta da cópia da petição inicial da ação originária (fl. 25) - o qual vinha sendo renovado sucessivamente até junho de 2008, quando então a seguradora cancelou o contrato, informando que seria impossível manter o pactuado, devido à "inviabilidade técnica e comercial das condições e custos anteriormente praticados" (fls. 56 e 62).
Ocorre que, analisando as argumentações esposadas na inicial, constata-se que o verdadeiro motivo da negativa de renovação das apólices deveu-se à mudança de faixa etária de alguns segurados ou, como afirmou a própria agravante, a "diferença entre a configuração do grupo atual e a do grupo originalmente contratado" (fl. 07).

Ora, como visto, a empresa segurada é a mesma, e o que mudou, conforme narrado, foi o perfil de alguns empregados desta - beneficiários do seguro de vida, que agora apresentam idade mais elevada - incrementando o risco de incidência dos eventos danosos previstos no contrato.

Assim, não há negar, o objetivo maior da recorrente é, simplesmente, alcançar o máximo de lucro nas suas atividades, desconsiderando outros valores jurídicos relevantes, caso contrário não tomaria como base a idade dos segurados para calcular o valor do prêmio.
Por seu turno, imperioso destacar que a relação contratual entre os litigantes já perdura por longo tempo - 3 (anos) anos - não se mostrando correto, tampouco razoável, que, de uma hora para outra, sejam os segurados surpreendidos com uma rescisão unilateral de contrato.
Realmente soa muito tentador - mas proporcionalmente injurídico - para as seguradoras, manterem no seu rol de clientes somente indivíduos jovens, com baixo grau de sinistralidade, altamente rentáveis, para depois, com o passar do tempo e o aumento da probabilidade dos riscos e danos acontecerem, simplesmente enviar uma notificação informando que devido à "inviabilidade técnica e comercial", não possuem mais interesse em mantê-lo como segurado.
Ora, de se concluir, então, que tanto a justificativa quanto a conduta apresentadas pela recorrente revelam-se, para se dizer o mínimo, abusivas e ilícitas, ferindo de morte, entre outros, o princípio da boa-fé objetiva, balizador dos contratos, como anteriormente exposado.
Deve-se ressaltar, por oportuno, que às avenças de seguro aplica-se a teoria do contrato de longa duração, no qual, segundo precedente desta Corte "o consumidor (cativo-cliente) possui expectativas de que a avença não tenha sua continuidade rompida, salvo na hipótese de relevante modificação na relação fática apresentada quando da contratação" (AI n. 2007.021869-1, de Chapecó, Rela. Desa. Salete Silva Sommariva), o que, acrescento, não se configurou na hipótese.
Assim, pode-se afirmar, em análise perfunctória, que ausente qualquer justificativa plausível que autorize a recorrente a resilir unilateralmente o contrato de seguro, deve este manter-se íntegro como inicialmente convencionado, sob pena de se promover a insegurança e a instabilidade desse tipo de relação jurídica, em prejuízo da parte mais fraca.
Portanto, dessume-se cristalino que, diante das circunstâncias apresentadas, a prova inequívoca que demonstra a verossimilhança das alegações do recorrido está caracterizada pela adesividade da avença, pela abusividade da cláusula que nega a renovação do contrato e, ainda, pela manifesta incidência da legislação consumerista, autorizando o deferimento da antecipação de tutela de mérito.
Vislumbra-se, por sua vez, a presença do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, tendo em vista que não podem os empregados da recorrida ficarem desprovidos da cobertura securitária enquanto esperam pela solução definitiva do processo, justamente em um período de vida em que ficam mais propensos aos riscos cobertos pelo seguro.
Nessa linha, cito precedente desta 4ª Câmara de Direito Civil, segundo o qual "Verificados todos os requisitos do art. 273, do Código de Processo Civil, a tutela antecipada deve ser deferida. Aplica-se aos contratos de seguro de vida a teoria dos contratos cativos de longa duração, mantendo-se o consumidor na continuidade da avença firmada entre os litigantes. Mostra-se abusivo o comportamento da seguradora que, sob o pretexto de readequação contratual, impõe a contratação de novo plano, mais oneroso ao segurado". (AI n. 2007.000599-1, de Blumenau, Rel. Des. Monteiro Rocha, j. em 22.11.2007).
Isso posto, pelo meu voto eu conheço do recurso e nego-lhe provimento, para manter, porque correto, o despacho combatido.
DECISÃO
Do exposto, nos termos do voto do Relator, a Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Participaram do julgamento, realizado no dia 5 de março de 2009, os Exmos. Srs. Desembargador Monteiro Rocha e Desembargador Victor Ferreira.
Florianópolis, 6 de março de 2009.
Eládio Torret Rocha
PRESIDENTE E Relator

Gabinete Des. Eládio Torret Rocha

domingo, 31 de maio de 2009

Competindo com boa-fé

Pelo Código de Defesa do Consumidor tanto empresas como clientes estão obrigados a agir com boa-fé nas suas relações contratuais. Trata-se a boa-fé de um principio que impõe aos contratantes deveres que nem sempre estão expressos nas cláusulas do contrato, mas que são exigíveis como se tivessem sido escritos em letras garrafais.

Um contrato é um conjunto de informações sendo que hoje nem sempre estas informações estão no papel. Muitos contratos são firmados pela internet, onde o cliente somente tem acesso às suas cláusulas antes do click do mouse. Outros, são firmados em terminais eletrônicos de agências bancárias ou de shoppings center’s, e o cliente toma apenas conhecimento da possibilidade de ter acesso às cláusulas contratuais. Ainda, há contratos que são realizados por telefone nos quais o atendimento (a contratação) é realizado boa parte por uma gravação de voz acionada pelos números do aparelho.

Nas relações de consumo o contrato vem se “desmaterializando”. Quero dizer: o contrato está saindo da folha de papel. Apesar do CDC impor como direito do consumidor o conhecimento prévio das cláusulas contratuais, isto não significa que necessariamente o cliente tenha de lê-las. Significa que o consumidor deve ter a oportunidade de lê-las.

“A “desmaterialização do contrato” faz com que as cláusulas contratuais escritas e ordenadas passem a perder a sua importância frente a outros deveres contratuais que são decisivos, inclusive, decisivos para considerar válida qualquer cláusula inserida em um contrato. Estes deveres decorrem da obrigação dos contratantes de atuarem com boa-fé ao longo da relação contratual”.


Apesar da boa-fé ser uma obrigação de ambos os contratantes, a empresa tem potencializada esta obrigação frente ao cliente-consumidor, já que é ela que impõe os termos do contrato, que traça as bases negociais, e é a profissional na relação de consumo. O cliente - como o CDC conceitua - é o destinatário final do produto ou do serviço e procura o fornecedor - em síntese – por uma satisfação pessoal. Não se trata o contrato de consumo essencialmente de um negócio: Para a empresa é um negócio, para o cliente, uma necessidade frente às demandas que a vida moderna impõe, como o telefone celular, o GPS do automóvel, uma viagem de férias, a decoração do apartamento etc...Razão que faz com que o contrato em si – aquele da folha de papel – perca cada vez mais a sua importância para o cliente-consumidor, pois este contrata por necessidade e não quer discutir cláusulas contratuais.

“Entre a empresa e o cliente é indispensável que seja cultivada uma forma de pensar e de atuar comum e esperada. A boa-fé é isto: uma forma de pensar e de atuar “comum e esperada”. A empresa age com boa-fé quando cumpre seus deveres de bem informar e de cooperar com o cliente. Além disso, a empresa deve cuidar para que o cliente não seja onerado sem necessidade ou sofra quaisquer prejuízos por conta do contrato de consumo. Este é o procedimento comum e esperado não só pelo cliente, mas pelo mercado consumidor.”

A empresa deve ser proativa, deve ir ao encontro das necessidades do cliente e isto começa já na fase pré-contratual. Se a empresa está oferecendo o produto através de quaisquer ferramentas de marketing ou é o cliente que se dirigiu ao estabelecimento empresarial para adquiri-lo, pouco importa. O “dever de bem informar” que decorre da boa-fé, exige, por exemplo, que os atendentes estejam qualificados, que entendam do produto, das suas peculiaridades, da sua utilidade, saibam qual o perfil do cliente foco do produto. Todo produto ou serviço deve ser abordado na sua dimensão de qualidade, pois que no fundo qualquer cliente de qualquer empresa não quer adquirir o “produto ou serviço econômico”: Quer adquirir “qualidade”. “Qualidade” que lhe proporciona “satisfação”.

“A empresa quer demanda, o cliente quer satisfação, mas todos os dois querem: Qualidade”.

A empresa que ofertar produtos com qualidade e para isto investe no processo produtivo, em tecnologia, em recursos materiais, humanos etc... O cliente, ao seu turno, quer adquirir produtos com qualidade e para isto se vale do mercado, porque no mercado está o padrão de qualidade dos produtos e serviços. A empresa busca estabelecer o perfil do cliente. O cliente, o perfil do produto ou do serviço. Neste flerte, cliente e empresa se encontram no mercado, sendo que o cliente confia que a empresa que escolheu oferta produtos com o padrão de qualidade estabelecido pelo mercado. Ora, se falo em “confiança”, falo em boa-fé. O cliente confia na empresa (o consumidor no fornecedor). Uma confiança de que a empresa vai lhe vender um produto ou um serviço que tenha o padrão de qualidade estabelecido no mercado, sobretudo, pelo fato de que os produtos ou serviços muito se assemelham na concorrência.

“O cliente confia na empresa no sentido de que está adquirindo um produto ou um serviço de qualidade, o que faz com que a empresa não possa quebrar esta confiança, isto é, a empresa deve agir com boa-fé e ofertar no mercado produtos ou serviços que tenham qualidade. Boa-fé é qualidade. Qualidade é boa-fé”.

Atender bem o cliente é um diferencial de competitividade. O atendimento cortês sempre será esperado, no entanto, o atendimento que faz o diferencial é o que informa. A empresa que atende com informações e não só com gentilezas está sempre um passo à frente (ou não está um passo atrás). Se vivemos na era da informação, onde o “novo” transformou-se em algo banal e os dados em um cabo de rede correm muito além de metros por segundo ao quadrado, as informações que o cliente tem sobre o produto ou o serviço nunca serão todas aquelas que o fornecedor (a empresa, o vendedor) tem acesso. Quando a empresa atua com foco em um segmento específico de mercado acaba desenvolvendo no seu produto ou serviço informações que são importantes para o seu cliente-foco. A empresa que atua com foco conhece o seu produto e conhece o seu cliente e o cliente passa a estar no seu produto (input). As suas informações estão nele gravadas posto que se o cliente é foco o produto é feito sob medida. Assim, a venda (output) nada mais é do que falar do cliente e sugerir novos níveis de satisfação para o cliente. São inputs e outputs, entradas e saídas de informações que vão além de sorrisos, tapetes e cafezinhos de recepção.

"O dever de bem informar se torna um dever de estar informado, principalmente quanto ao seu cliente. O cliente espera que a empresa o conheça. A empresa deve estar bem informada para bem informar: Isto é boa-fé.Isto é qualidade!"

O cliente tem o padrão de qualidade do mercado e algumas informações sobre o produto ou o serviço da empresa que escolheu na concorrência. Às vezes, tem muito mais informações da empresa do que do próprio produto ou serviço. Como estes são muito parecidos, acaba o cliente buscando o diferencial no histórico da empresa, dos seus sócios, no seu balanço social, no poder de empatia que o marketing produziu etc... Assim, quem vai atender, tem que ter informações. É o seu dever jurídico e econômico. Se o dever econômico não é cumprido, não gera demanda. Se o dever jurídico não for cumprido, gera prejuízo. Pelo principio da boa-fé não existe mais a figura do dolus bonus, isto é, da empresa se calar quanto a determinado aspecto do produto, que se o cliente tiver conhecimento fará com que decida por não adquiri-lo.

"O cliente não pode ser surpreendido, pelo menos, com péssimas surpresas. Há um dever de transparência entre as partes na relação de consumo. Isto tem haver com informação: A empresa mostra o que é e o que o produto ou o serviço são. Transparência é informar e informar é agir com boa-fé".


Agir com boa-fé não significa não estar agindo de má-fé. O agir de boa-fé é objetivo. Como já frisado, é uma forma de pensar e de atuar comuns dentro do mercado e com base num organismo empresarial médio ou do consumidor ordinário. Não se exige mais nem menos do que o proceder médio, daquilo que geralmente é observado nas relações de consumo. É claro, as violações dos direitos dos consumidores fazem parte do cotidiano, infelizmente. Sobretudo, por conta do oligopólio exercido por grupos de organismos empresariais em determinados setores da economia. Isto faz com que nestes setores o procedimento médio seja aquilo que “deve ser”, não aquilo que “é” e aí os clientes-consumidores dependem muito da proteção do CDC e dos órgãos de defesa como procon’s, promotorias e juizados especiais. Agir com boa-fé é colaborar com o cliente, estar ao seu lado, é um dever de lealdade. A empresa colabora com o cliente quando obtém dele informações – novamente a informação – e oferta produtos e serviços adequados ao consumo. Para o CDC produto ou serviço adequado é aquele que tem padrão de qualidade, padrão de segurança, padrão de durabilidade e padrão de desempenho. A adequabilidade para o mercado consumidor é qualidade e qualidade para o mercado é satisfação.

"Colaborar com o cliente e auxiliá-lo na busca pela satisfação através de informações que a empresa fornece a respeito de produtos e serviços feitos para o cliente e a partir do cliente. É a propaganda ética, não a enganosa. É assessoria na escolha do produto e não a prática da “empurrometria”. É o pós-venda e não só a mala-direta promocional. É a prática do relacionamento comercial e não do ato de venda. Colaborar é estar ao lado. A empresa é uma colaboradora do cliente. Quer lhe proporcionar satisfação fornecendo-lhe qualidade"
.

Um código de ética e de padrão de qualidade para a empresa

É cultural em nosso país uma produção legislativa intensa. Há leis para tudo e para todos. De passagem, leis que nem sempre são observadas, ora por carecerem de legitimidade - o povo não quer e não cumpre a lei - ora por falta de fiscalização do próprio estado que resolve fechar os olhos e deixar a lei na folha de papel. Há, todavia, momentos brilhantes na história legislativa, onde diplomas legais não só são observados, mas funcionam como verdadeiros meio de transformação de conduta social. Um exemplo deste brilhantismo é o do Código de Defesa do Consumidor que sem sombra de dúvida, além da popularidade que amealhou no decorrer dos anos, tornou-se num instrumento de fomento de cidadania.

A idéia da criação de uma lei que trate especificamente sobre consumo se vincula a higidez da economia e a noção da vulnerabilidade econômica e técnica do consumidor frente aos organismos empresariais. Sobretudo, o fenômeno da criação de demanda se dá quase que invariavelmente pelo apelo às ferramentas de marketing (propaganda, promoção, publicidade e concurso) sendo o consumidor motivado diuturnamente à aquisição de novos produtos e serviços. Produtos e serviços que - a despeito de oportunizarem novas tecnologias, conforto e sofisticação - nem sempre são indispensáveis à vida cotidiana.

Nisto, o consumidor pode se ver inserido numa verdadeira roda viva, entendendo imprescindível sempre adquirir o novo modelo, a nova versão, o novo produto, o novo serviço. Aliás, a modernidade impõe status a quem acompanha a novidade e, por conseguinte, frustração pelo uso do velho, do démodé. Assim, dentre outras razões, vê-se necessária uma lei especial para a proteção do consumidor já que ele não decide mais o que vai comprar, mas se dirige ao mercado pelo o que o mercado quer que ele consuma.

Há, todavia, uma outra tônica que se extrai do código e que requer ser ainda potencializada. Se o consumidor olha a lei focando os seus direitos, os fornecedores devem apreciá-lo focando o produto e o serviço. É que, se por um lado o CDC serve para a defesa do consumidor, para os fornecedores o código impõe um padrão de qualidade para produtos e serviços levados ao mercado de consumo.

Já faz algum tempo que “qualidade” deixou de ser um diferencial de competitividade para se transformar numa condição de mercado. Se a empresa quer aquinhoar uma fatia do mercado, tem que ofertar produtos ou serviços de qualidade. Caso o produto ou o serviço não possuam qualidade certamente não vingará o empreendimento.

Quando a metodologia da qualidade desembarcou em solo nacional, não havia dúvida que a empresa que nela investisse tomaria saliência frente aos concorrentes. Hoje, entretanto, a realidade conspira para que se reconheça que a qualidade não difere mais a concorrência ou talvez, o padrão de qualidade que funciona como diferencial passou um ser um outro denominado por alguns como padrão de excelência, que pode se explicar como sendo uma espécie de upgrade de padrão qualidade. O Código de Defesa do Consumidor serve como uma baliza entre estes padrões. Exemplificando, todo produto ou serviço para ter qualidade tem que ter garantia. Isto além de ser exigência do cliente, é imposto pela lei. O Código é claro ao estipular um prazo de garantia legal para produtos duráveis a lei assegura garantia mínima de 90 dias, para os não duráveis, 30 dias. Este é padrão de qualidade para garantia do produto. O padrão de excelência, pode-se supor que é o da garantia ampliada, como o do televisor que é garantido de uma copa do mundo a outra. O Código, nesta visão, transforma-se numa ferramenta importante para o planejamento de produtos e de serviços. Produtos e serviços não só de qualidade, mas “excelentes” ao consumo e diferenciados frente à concorrência.

Nota marcante do CDC é o direito de informação onde o consumidor adquire não só o produto, mas toda a informação necessária para que possa dele fruir em toda a sua dimensão (dimensão de qualidade). Não basta um produto ou serviço prezar pela qualidade quando o consumidor não sabe como dele fruir. Torna-se inadequado e compromete o patrimônio do cliente. A informação é imprescindível para a sociedade de conhecimento e, da mesma forma, para a sociedade de consumo. A informação compõe o preço do produto e por tal característica, é paga pelo cliente.

Por outro lado, o fenômeno da corrupção é impressionante. Escândalos no meio político se avolumam como se produzidos especialmente para gerar audiência nos noticiários. A corrupção é uma endemia que deve ser estirpada da sociedade brasileira. Nem se reclama tanto da economia quanto da corrupção. Ela vilipendia o ânimo e desafia o entusiasmo. Entretanto, a corrupção não é uma causa, mas sim um efeito: Efeito da falta de ética. Quando se fala em ética, o conteúdo do CDC seguramente assume uma terceira dimensão ou significado.

Se o código funciona para o consumidor como meio de defesa dos seus direitos e para a empresa como código de padrão de qualidade de produtos e serviços, com relação à concorrência, o código estabelece um padrão ético a ser adotado, um verdadeiro código de ética da livre concorrência.

A livre concorrência é um dos sustentáculos da ordem econômica. Não se admite mais que empresas ou setores sejam aquinhoados por governos. Por outro lado, sem concorrência não há qualidade e sem qualidade, não há desenvolvimento. Desta forma, prezar pela ética no mercado, além de assegurar benefícios diretos ao próprio mercado, contribui para com a própria sociedade fomentando a ética nas relações tanto entre entes privados, como também, com o setor público.

O Código funciona entre concorrentes como um código de ética, vedando, em exemplo, a propaganda enganosa que não ludibria apenas o consumidor, mas também o concorrente que de certa forma se vê impelido a fazer mais investimentos no seu produtos ou serviço para poder continuar competindo.

Por fim, passados mais de dez anos da vigência Código de Defesa do Consumidor, visualiza-se que ainda há nele um potencial represado e que pode representar diferencial tanto na criação de demanda, como também na transformação da sociedade brasileira: Minorando a corrupção, promovendo a ética, salvaguardando a qualidade... mirando a excelência!