|
A Justiça do Trabalho - que tende a responsabilizar o comprador de uma empresa pela dívida trabalhista existente na época em que ocorreu o negócio - adotou recentemente posição diversa à sua jurisprudência e entendeu que o comprador não pode responder por débitos anteriores à aquisição. O caso julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, porém, trata de sucessão em venda efetuada por empresa em recuperação judicial. Na avaliação de advogados, a decisão do tribunal reflete a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) adotada em maio deste ano. A corte julgou o artigo 141 da nova Lei de Falências, que no inciso II estabelece a inexistência de sucessão. Ao interpretar o dispositivo, o Supremo entendeu que os compradores não herdariam o passivo trabalhista e tributário. O TRT, em julgamento considerado inédito por aplicar expressamente o posicionamento da corte superior, entendeu que a VRG Linhas Aéreas (a nova Varig) - pertencente ao grupo Gol - e a Varig Logística não são responsáveis solidárias pelos débitos da Varig, anteriores à efetivação do negócio. No caso analisado, um ex-trabalhador da Varig pleiteava na Justiça o pagamento de horas extras. Já existem outras decisões no TRT-SP posteriores ao julgamento do Supremo, tanto favoráveis quanto desfavoráveis à sucessão. Esse, porém, foi o primeiro caso em que um magistrado citou explicitamente a decisão do STF. A utilização do entendimento da corte superior aos casos concretos, no entanto, ainda é polêmica. Advogados de empresas que compraram ativos de companhias em recuperação afirmam que essa interpretação adotada pelo Supremo e aplicada pelo TRT é acertada. Os ministros entenderam, na época, que a Lei de Falências é coerente com a necessidade de preservação das empresas. Isso porque uma possível sucessão reduziria o interesse de terceiros por aquisições de companhias em recuperação. Por outro lado, advogados de trabalhadores alegam que a interpretação, na prática, traz danos ao trabalhador que terão ainda menos chance de receber o que é devido. Além disso, alegam que o julgamento o STF não poderia ser diretamente aplicado para excluir a sucessão. Os advogados da Varig logística no caso julgado pelo TRT de São Paulo, Daniela Cristina Crepaldi e Adriano Lorente Fabretti, do França Ribeiro Advocacia, afirmam que tendência é a de que a Justiça passe a aplicar o entendimento do Supremo para afastar qualquer tipo de sucessão trabalhista na venda desses ativos. Na avaliação deles, como o julgamento no Supremo foi em uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin), o efeito do entendimento seria para todos os casos semelhantes. Como consequência disso, a advogada afirma que o escritório já entrou com embargos de declaração em todos os julgados contrários à empresa, que pertencem ao escritório, para que o juiz tenha tenha que decidir com base no julgamento do STF. Há especialistas que entendem, porém, que o julgamento do Supremo não encerrou o assunto. O advogado Sebastião José da Motta, do Motta & Motta Advogados, que assessora trabalhadores e que atuou como advogado do PDT- autor da Adin analisada pelo Supremo - , afirma que o julgamento não pode ser aplicado a casos concretos, até porque o julgado ainda não foi publicado no Diário Oficial. Além disso, ele ressalta que o Supremo tende a rejeitar a tese de que decisões abstratas concedidas em Adin tenham efeito vinculante. Para ele, o Judiciário ainda terá que entrar na discussão de casos concretos para definir qual o limite da não-sucessão. No caso da Varig, o advogado alega existir uma peculiaridade. Para ele, a Varig Logística era controlada pela Varig e fazia parte do mesmo grupo econômico, por isso seria o que se chama de responsável solidária nessas ações.O relator da ação na 12ª Turma do TRT-SP, Delvio Buffulin, aplicou ao caso o entendimento do Supremo, ainda que a sua opinião pessoal seja contrária a dos ministros. Para o magistrado, há sucessão mesmo quando não há transferência integral do fundo de comércio, ou quando há a simples continuação da atividade empresarial, ainda que a razão social seja diversa ou que haja alteração do nome do estabelecimento. Porém, ele afirma que diante do julgamento ocorrido no Supremo "não há outra solução senão o reconhecimento da inexistência de sucessão". O advogado Carlos Duque Estrada Júnior, que atua na defesa dos trabalhadores, também acredita que não há mais como questionar a exclusão da sucessão. "As recentes decisões do STF já retiram qualquer possibilidade de contestação, o que é péssimo para os trabalhadores". Apesar de ser talvez a única que já considera o julgamento do Supremo, a decisão do TRT foi comemorada por advogados que defendem empresas em recuperação. Para Paulo Penalva, do escritório Motta, Fernandes, Rocha Advogados, o posicionamento da Justiça paulista está correto, pois se herdassem os passivos trabalhistas, as empresas ficariam desestimuladas a adquirir ativos de companhias em recuperação judicial. O advogado Julio Mandel , do Mandel Advocacia, afirma que essa decisão é benéfica para toda a sociedade, inclusive para os trabalhadores, que estarão entre os primeiros a receber valores resultantes da venda desses ativos, revertidos para o pagamento de credores. Procurado pelo Valor, o advogado da Varig no caso julgado pelo TRT, José Roberto Zago, afirmou que não está autorizado a se manifestar. O advogado da VRG Linhas Aéreas não foi localizado e a assessoria de imprensa da Gol preferiu não comentar a decisão. |
Fonte: Valor Econômico, por Adriana Aguiar, 17.09.2009 |
Nenhum comentário:
Postar um comentário