terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Alvará - Escritório de Advocacia

Dados do acórdão
Classe: Apelação Cível em Mandado de Segurança
Processo: 1988.035934-8
Relator: Napoleão Amarante
Data: 22/02/1990

DJ: 7.976DATA: 22/03/90PAG: 06

Apelação cível em mandado de segurança n. 2.983, de Tubarão.

Relator: Des. Napoleão Amarante.

MANDADO DE SEGURANÇA. EXIGÊNCIA PELO PODER PÚBLICO MUNICIPAL DE TAXA DE RENOVAÇÃO, FUNCIONAMENTO E VISTORIA DE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. TRIBUTO INDEVIDO. WRIT CONCEDIDO. SENTENÇA CONFIRMADA.

De acordo com decisão do egrégio Supremo Tribunal Federal e de orientação pacífica deste Tribunal não tem cabimento aludido tributo, por falta de exercício do poder de polícia, cuja fiscalização está indiscutivelmente afeta à Ordem dos Advogados do Brasil.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível em mandado de segurança n. 2.983, da comarca de Tubarão, em que são apelantes o Município de Tubarão e o Fiscal de Tributos Municipais, sendo apelado César Augusto Prudêncio da Costa:

ACORDAM, em Primeira Câmara Civil, por votação unânime, conhecer dos recursos e negar-lhes provimento para confirmar a sentença de PrimeiroGrau.

Custas na forma da lei.

E assim decidem de acordo com a sentença da lavra do Dr. José Trindade dos Santos, ilustre titular da 1a. Vara da comarca de Tubarão, a seguir transcrita:

"Através seu procurador, e com fundamento nos dispositivos da Lei n. 1.533/31.12.51, CÉSAR AUGUSTO PRUDÊNCIO DA COSTA, na inicial qualificado, impetrou contra PAULO CÉSAR FERNANDES PEREIRA, Fiscal de tributos Municipais, o presente MANDADO DE SEGURANÇA (autos n. 0474/88).

"Expõe o impetrante, em resumo, o que se segue:

'O impetrante exerce a profissão de advogado, tendo escritório estabelecido nesta cidade, à Rua Coronel Cabral n. 54, sala n. 04; e, apenas para fins previdenciários, já que os estabelecimentos bancários exigem a apresentação de alvará de licença e/ou funcionamento, expedido pela Prefeitura Municipal, para fornecer o primeiro carnê de recolhimentos de contribuições, o impetrante, no ano de 1986, e igualmente no ano de 1987, requereu junto à municipalidade a expedição do referido alvará, pagando a respectiva taxa.

'Entretanto, no ano em curso, impetrante deixou de requerer a expedição do alvará em questão e, em decorrência, não pagou a taxa de licença para a localização e funcionamento, por entender desnecessário, e até indevido, o recolhimento dessa taxa aos cofres municipais, tendo em vista a sua condição de advogado.

'Diante disso, em 30 de agosto de 1988, foi o impetrante notificado para que, em dez dias, recolhesse aos cofres municipais o tributo referente à taxa de renovação, funcionamento e vistoria, previsto no art. 250 da Lei Municipal n. 681/74, por infração ao art. 250, § 2o., da mesma Lei.

'E não havendo o impetrante acatado os termos de tal notificação, o impetrado, em 27 de setembro de 1988, lavrou o auto de infração n. 671, intimando-o para que, em trinta dias, recolhesse ao tesouro municipal a quantia de Cz$1.165,08, por infração ao art. 125, parágrafo único, da Lei n. 681/27.12.74.

'A questão da cobrança, pelo Município, da taxa de licença e localização para funcionamento de escritórios de advocacia já foi debatida, entretanto, em outras demandas judiciais; e a jurisprudência, inclusive a do Excelso Pretório, assim como a do Colendo Tribunal de Justiça do nosso Estado, pacificou-se, entendendo que a questionada taxa é indevida pelos profissionais de advocacia, por não ter o município nenhum poder de polícia sobre a profissão de advogado, nem mesmo sobre seu escritório, cuja a fiscalização está afeta à Ordem dos Advogados do Brasil.

'O ato do impetrado, assim, representa uma evidente ilegalidade e viola o direito líquido e certo do impetrante, qual seja o de não pagar a mencionada taxa, consoante interativa e remansosa jurisprudência a respeito.'

"Destarte, evidenciados os requisitos do art. 7o., inc. II, da Lei n. 1.533/51, impõe-se a concessão da segurança liminar, a fim de ser tornado sem efeito o auto de infração n. 671, lavrado pelo impetrado contra o impetrante, até o término da presente ação, sendo, a final, definido o writ definitivamente, com a anulação do referido auto de infração.

"Atribuindo à inicial o valor de Cz$2.000,00, instruiu-a com os documentos de fls. 7 a 12.

"Deferida a segurança liminarmente (despacho de fls. 14), foi o impetrado notificado, tendo apresentado, então, as informações de fls. 16 e 17, instruídas com os documentos de fls. 18 a 23.

"O Dr. Promotor de Justiça manifestou-se, então, às fls. 25 e 26, pela concessão da segurança pleiteada.

"Vieram-me, após, conclusos os autos.

"É o relatório.

"PASSO A DECIDIR:

"Cogita-se, na hipótese in juditio de MANDADO DE SEGURANÇA, embasado no art. 1o. e ss. da Lei n. 1.533, de 31.12.51, em que é impetrante o Dr. CÉSAR AUGUSTO PRUDÊNCIO DA COSTA e impetrado PAULO CÉSAR FERNANDES PEREIRA, Fiscal de Tributos Municipais.

"De conformidade com o preceituado pelo art. 1o. da Lei n. 1.533, 'Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, alguém sofrer violação ou haver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça'.

"A mesma norma encontra-se insculpida no art. 5o.. inc. LXIX, da Constituição da República Federativa do Brasil, quando, in verbis, dispõe:

'Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público'.

"In specie, os motivos da impetração aforada podem ser assim sintetizados:

"Exercendo o impetrante a profissão de advogado nesta cidade, com escritório situado à Rua Coronel Cabral n. 54, sala 04, apenas para fins previdenciários, posto que os estabelecimentos bancários exigem a apresentação de alvará de licença e/ou funcionamento para fornecer o primeiro carnê de recolhimento de contribuições, o impetrante, nos anos de 1986 e 1987, requereu a expedição, pela municipalidade, do mencionado alvará, pagando, então, a respectiva taxa.

"Todavia, por entendê-lo desnecessário, e mesmo indevido, dada a sua condição de advogado, o postulante deixou de requerer, no ano de 1988, a expedição do alvará em apreço, e, em decorrência, não pagou a taxa de licença para a localização e funcionamento.

"Em razão disso, em 30.08.88, foi o impetrante notificado pelo impetrado, para que, em dez dias, efetuasse o recolhimento, aos cofres do Município do tributo correspondente à taxa de renovação, funcionamento e vistoria, prevista no art. 250 da Lei Municipal n. 681/74, por infringência ao parágrafo 2o. do mesmo dispositivo.

"E não havendo o impetrante acatado a notificação expedida, o impetrado, em 27.09.88 lavrou ato de infração n. 671, notificando-o, então, para que, em trinta (30) dias, efetuasse o recolhimento da quantia de Cz$1.165,08, por infringência do art. 125, parágrafo único, da Lei n. 681/27.12.74.

"Contudo, a questão já foi debatida em inúmeras outras demandas judiciais e a jurisprudência, inclusive a do Excelso Pretório, como também a do egrégio Sodalício Catarinense, pacificou-se, entendendo ser indevida a cobrança, pelos municípios, da taxa de licença para funcionamento de escritório de advocacia, posto não exercer o município qualquer poder de polícia sobre a profissão de advogado, nem mesmo sobre seu escritório, cuja a fiscalização está afeta, com exclusividade, à Ordem dos Advogados do Brasil.

"O ato do impetrado, em sendo assim, reveste-se de evidente ilegalidade, e viola direito líquido e certo do impetrante, qual seja o de não pagar a taxa em apreço.

"Prestando suas informações, o apontado coator argumenta somente que o auto de infração contra o qual se insurge o postulante foi lavrado com o fulcro no Código Tributário Nacional - arts. 77 a 80 - e no Código Tributário Municipal - Lei Municipal n. 681/31.12.74 -, que tratam do exercício regular do poder de polícia municipal.

"Informa, outrossim, o impetrado de que o débito do autor do mandamus para com a Fazenda Municipal encontra-se lançado em dívida ativa, pelo não atendimento da ação fiscal, para posterior cobrança judicial.

"De sua vez, o Dr. Promotor de Justiça desta 1a. Vara Cível, após transcrever ensinamentos do culto Hely Lopes Meirelles, argumenta ser perfeitamente viável a imposição pelo poder Público Municipal, da licença, mediante alvará de cobrança da taxa correspondente, para a localização e funcionamento de escritórios, ainda que destinados ao desempenho de profissões que, a exemplo da de advogado, sejam disciplinadas por instituto próprio.

"Entretanto, no caso específico dos autos, a exigência da autoridade coatora, materializada no documento de f. 11, fundamentou-se em dispositivo que se refere à 'cassação, limitação ou suspensão de licença para o exercício de atividade' (art. 250 do Código Tributário Municipal), e inaplicável, conseqüentemente, ao caso do impetrante, cuja profissão sujeita-se à regulamentação superior da esfera federal.

"Assim, a ilegalidade do propósito manifestado pelo impetrado faz-se evidenciada, pelo que, sob último enfoque, está o ato impugnado a ferir direito líquido e certo do impetrante, conduzindo ao deferimento da segurança pleiteada.

"Posto dessa forma, ante as ponderações das partes e do Dr. Promotor de Justiça desta 1a. Vara Cível, o conteúdo do presente writ, resta-nos examiná-lo, face os princípios legais atinentes à espécie !

"Certo está que, no discurso competente de HELY LOPES MEIRELLES, 'Compete ao Município a polícia administrativa das atividades urbanas em geral, para a ordenação da vida da cidade, estendendo-se este policiamento a todas as atividades e estabelecimentos urbanos, desde a sua localização até a instalação e funcionamento, não para o controle do exercício profissional e do rendimento econômico, alheios à alçada municipal, mas para a verificação da segurança e da higiene do recinto, bem como a da própria localização de empreendimento (escritório, consultório, banco, casa comercial, indústria, etc.) em relação aos usos permitidos nas normas de zoneamento da cidade' (Direito Municipal Brasileiro, págs. 371/372, 1985, ERT, SP).

"Assim, à prima facie, diante de tal abalizado entendimento, poder-se-ia concluir que, efetivamente, dentro do poder de polícia atribuído aos municípios, teriam esses total legitimidade para exercer o controle sobre a localização e funcionamento de qualquer empreendimento situado dentro de seus limites geográficos, podendo, para tanto, exigir o competente alvará de licença, bem como impor a cobrança das taxas respectivas.

"Porém, não é bem assim!

"Ocorre que a cobrança da taxa de licença e funcionamento para escritórios de advocacia, pelos municípios, revela-se inteiramente ilegal, por falta de fato gerador legítimo.

"Segundo o disposto no art. 250 do Código Tributário, Municipal de Tubarão (Lei n. 681/31.12.74):

'A taxa de licença é devida em decorrência da ação reguladora do Município, mediante a concessão, renovação, cassação, limitação ou suspensão de licença para o exercício de atividades ou para a prática de atos que afetem ou possam afetar o interesse coletivo'.

"Mas, dentro do conceito mais amplo que se possa emprestar ao estímulo das taxas de competência do município, mesmo que examinado minudentemente o transcrito preceito do Código Tributário Municipal local, torna-se evidenciado que não teriam elas a menor pertinência quanto aos escritórios de advocacia.

"Nem sob o prisma da retribuição pela utilização efetiva ou potencial dos serviços públicos específicos e divisíveis, postos à disposição do profissional da advocacia, e nem, muito menos, sob o apregoado exercício do poder de policia que, in specie, mostrar-se-ia absolutamente inconseqüente e descabido.

"Ora, referentemente aos escritórios de advocacia, ainda que situados em seu âmbito administrativo, não exerce o município um efetivo controle de polícia!

"Esse poder controlador é, em verdade, exercido exclusivamente pela Ordem dos Advogados do Brasil; o fato gerador da taxa é, pois, atribuição da Ordem, criada por Lei Federal, sob cuja fiscalização restrita exerce o advogado o seu mister, e a quem paga ele anuidade.

"Diante disso, não é lícito à Prefeitura Municipal policiar o profissional da advocacia, nem mesmo o seu escritório, sob a assertiva de um poder de polícia administrativa que não tem, pelo que a taxa de licença e funcionamento se evidencia, em casos tais, manifestamente ilegal.

"Ressalta-se, aliás, que a polêmica aqui sub judice imerece maiores e mais profundos estudos.

"Em verdade, a possibilidade da cobrança, pelos Municípios, de taxa de licença e funcionamento a escritórios de advocacia é aspiração que vem sendo, pacífica e exaustivamente, desamparada pelos Tribunais Pátrios.

"Estes, ao contrário, vêm entendendo pelo incabimento de tais taxas, precisamente por não ter o Município nenhum poder de polícia sobre a profissão de advogado, e nem, ao menos, sobre o seu escritório, cuja fiscalização está adstrita, com exclusividade, à Ordem dos Advogados do Brasil.

"Veja-se, acerca da questão, os acórdãos assim ementados:

'TAXA DE LICENÇA MUNICIPAL - Escritório de Advocacia - Ilegalidade - Descaracterização do invocado exercício regular do poder de polícia e impertinência da alegada fiscalização, por inconseqüente.

'É manifesta a ilegalidade da cobrança da taxa de licença para o funcionamento de escritório de advocacia' (RT, 422/244).

'Não exercendo o Município efetivo controle de polícia sobre o escritório de advocacia vedado lhe é lançar o profissional para pagamento de taxa de licença de localização, funcionamento e instalação' (RT, 560/120).

"De modo idêntico, não divergindo desses entendimentos, assim tem decidido o colendo Tribunal de Justiça do nosso Estado:

'Mandado de segurança (autos remetidos). Taxa de licença municipal. Incabimento da cobrança sobre o exercício da advocacia ou pela localização de escritório de advocacia. Segurança mantida' (Rel. Des. MARCÍLIO MEDEIROS, JC, v. 5/6, pág. 41).

'Mandado de segurança. Taxa de Licença para Localização e Funcionamento.

'Ilegalidade. Sentença mantida.

'Incabível a pretendida cobrança de taxa denominada licença para localização, 'por não se compadecer com o conceito legal do poder de polícia, expresso no Código Tributário Nacional'.' (Rel. Des. REYNALDO ALVES, JC, v. 15/16, pág. 37).

'É defeso às Prefeituras municipais, por lhes faltar competência, poder de polícia ou direito à fiscalização de serviços, exigirem aos advogados o pagamento de taxa de licença paralocalização e funcionamento de seus escritórios profissionais, pois o exercício da advocacia não tem nenhuma sujeição ou vinculação com o município, senão e, exclusivamente, com a Ordem dos Advogados do Brasil' (Rel. Des. ERNANI RIBEIRO, JC, 39/56).

'Mandado de Segurança.

'Taxa de licença para localização e funcionamento.

'Escritório de advocacia.

'Ilegalidade da pretensão.

'Incabível a almejada cobrança da taxa assim denominada, por não se compadecer com o conceito legal do poder de polícia expresso no CTN' (Rel. Des. REYNALDO ALVES, JC, 42/38).

"Em decorrência deste entendimento jurisprudencial, manso e pacífico, iterativo e coerente, - e a jurisprudência é uma das fontes do direito -, dúvidas não restam de que a notificação de f. 11 e o auto de infração de f. 12, lavrados contra o impetrante, em razão de não haver ele satisfeito, perante os cofres municipais, a taxa referente à licença e/ou funcionamento para o funcionamento do escritório de advocacia que mantém nesta cidade, relativamente ao ano de 1988, revelam-se atos manifestamente ilegais, violando, pois, direito líquido e certo do mesmo.

"Por isso, impõe-se concedida a segurança pleiteada!

"EX POSITIS:

"Defiro a segurança pleiteada nestes autos de MANDADO DE SEGURANÇA n. 0474/88, para anular o auto de infração n. 671/88, lavrado, em 21.09.88, contra o impetrante CÉSAR AUGUSTO PRUDÊNCIO DA COSTA, pelo impetrado PAULO CÉSAR FERNANDES PEREIRA, Fiscal de Tributos Municipais, anulando em decorrência, eventual lançamento do débito em dívida ativa.

"Condeno o impetrado no pagamento das custas processuais, devidamente atualizadas, a contar da data do recolhimento, as adiantes pelo impetrante e que ao mesmo serão devolvidas".

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos Srs. Des. Protásio Leal e João Martins.

Florianópolis, 22 de fevereiro de 1990.

Napoleão Amarante

Presidente e Relator

Joel Rogério Furtado

Procurador de Justiça

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